INDICE

Ensinança 1: Os Mistérios do Sacrifício

Ensinança 2: O Tédio
Ensinança 3: A Luta pela Vida
Ensinança 4: As Mudanças Contínuas
Ensinança 5: O Passado
Ensinança 6: A Incerteza do Amanhã
Ensinança 7: A Carne
Ensinança 8: “O Que Dirão”
Ensinança 9: As Circunstâncias Materiais
Ensinança 10: A Compaixão
Ensinança 11: A Sabedoria
Ensinança 12: Os Defeitos Físicos
Ensinança 13:As Enfermidades
Ensinança 14: A Separatividade
Ensinança 15: As Taras Morais
Ensinança 16: A Morte


Ensinança 1: Os Mistérios do Sacrifício


Ainda que se queira fugir da dor, apesar de todos os esforços da civilização e dos adiantamentos modernos para tornar mais suportável a existência, a dor está sempre presente na vida do homem.
Agora, como há dois mil anos, podem ser aplicadas as palavras do apóstolo Paulo, já que em nada mudou a situação interna e mesmo externa do ser: "Combate e dor é a vida do homem sobre a Terra."
As religiões - e em particular a cristã - têm enaltecido o conceito da dor para torná-la mais tolerável. Certos filósofos mentalistas disseram, para vencê-la, que a dor é ilusão, miragem da mente humana. No entanto, a dor segue reinando constantemente no mundo.
Deve-se aceitar a dor, abraçá-la, conformar-se com ela, de acordo com o que dizem as religiões. Ou então, deve-se vencê-la pela força, derrotá-la, arrancá-la da alma humana.
Sobre uma das lápides do Templo da Divina Mãe, está impresso um axioma que elucida este dilema: "Vence a dor, submergindo-te nela."
A virtude do Sacrifício é aquela que concede aos discípulos o dom de vencer a dor por conhecimento próprio. Pelo Sacrifício, a dor, as mais cruéis privações, as enfermidades mais longas, as desorientações mais intensas e mais internas, transformam-se em um néctar suave.
Assim como a abelha transforma em mel o amargo suco da flor, a alma, pelo Sacrifício, transforma em felicidade e glória os padecimentos humanos. Não é isto o que quer simbolizar a Rosacruz?
A alma se transforma pelo sofrimento. Dentre os espinhos brota a flor maravilhosa. Não é isto o que quer simbolizar a Ressurreição de Cristo, depois do padecimento na Cruz?
Certos ritos conheceram este segredo fundamental e procuraram, pelo mantra, através da oração vocal, estimular o devoto a que tivesse força para suportar as dores da vida. Ainda hoje, os sanyasin da Índia usam no pescoço, correntes feitas com pequenas sementes de frutas de árvore que passam entre seus dedos ao rezar. Os cristãos têm no rosário, uma prática semelhante.
O Sacrifício tem diversos matizes, diversas formas. É necessário por diversas causas e em determinados momentos.
Podem-se distinguir estes matizes por meio de um rosário mental, dividido em quinze mistérios de compreensão. Diz-se “mistérios” porque a raiz da dor é tão grande como a raiz da Eternidade. Conhecer o porque da dor pelo Sacrifício unitivo é conhecer a própria Eternidade.


Ensinança 2: O Tédio

Pode o homem ter tudo. Pode gozar de todos os bens da vida e de uma perfeita saúde. Pode viajar de um ponto a outro da Terra. Não obstante, numa determinada hora do dia, um importuno visitante se aproximará dele: é a dor do tédio humano, o cansaço das horas que voam, a sensação indefinida de que algo se perdeu para sempre. É o sentido oculto de que um mal ignoto pode sobrevir a qualquer momento. Quem não experimentou esta sensação? Ainda o Adepto não pode vencer este inimigo mortal que é o tédio e o cansaço interior. Fugir dele é encontrá-lo. Disfarçá-lo, buscando a multidão e a diversão, é tê-lo estreitamente abraçado. Um só remédio existe para vencê-lo: o Sacrifício de ir ao seu encontro, de olhá-lo face a face, de estudá-lo, analisá-lo, conhecê-lo.
Um grande Iniciado dizia: "Minha vida está continuamente absorta em Deus, mas há uma hora em cada dia, na qual tudo se torna obscuridade a meu redor, na qual os consolos divinos, as compreensões infusas, parecem estar tão longe como se nunca os houvesse conhecido. A princípio, esta hora era a mais terrível para mim. Mas, desde que compreendi que é o pólo oposto à minha vida espiritual - já que sobre ela me firmo para alçar mais alto vôo - espero-a com alegria e saboreio nessa hora de obscuridade, o mesmo gozo que experimento nas horas mais gloriosas de luz".


Ensinança 3: A Luta pela Vida


Porém, não só o inimigo interno golpeia a porta da alma nas horas tristes, mas tudo o que rodeia o homem é causa de dor. Acaso não é toda a vida uma destruição contínua em proveito da subsistência? E acaso não são os homens todos, em maior ou menor grau, seres que querem absorver outros homens? Diríamos, em sentido figurado, que o planeta mais forte sempre quer absorver o mais fraco. E esta luta contínua para manter a independência, esta tentação contínua do mundo que chama, elogia, persegue, ajuda e destrói o homem, quantas amargas dores proporciona.
Mas o Sacrifício, que dá a força necessária para suportar o golpe sem sucumbir  a ele, que dá o valor para conhecê-lo, aceitá-lo e afastá-lo em determinado momento, é o meio pelo qual se chega ao conhecimento do próprio valor e da própria responsabilidade. Os que fogem da dor caem continuamente nela. Os que temem o sofrimento sempre o têm sobre si. Mas os que o enfrentam para  conhecê-lo e conquistá-lo ganham com seu sacrifício a auréola da liberdade.
Nenhum dos humanos pode escapar da dor, mas muitos deles têm feito da mesma, uma fonte de compreensão e de felicidade. Ainda os homens que nada sabem da vida espiritual se vangloriam de haver sofrido muito, pois estimam que a dor os cutiu e fez homens. Dizia Krishnamurti em uma de suas pregações: “Não fujas da dor: une-te a ela”.


Ensinança 4: As Mudanças Contínuas
A variabilidade do Universo Manifestado é fonte de mudanças contínuas e o homem que, por sua natureza divina, tende ao estático no ponto em que se encontra, padece amargamente por estas repetidas mudanças.
Hoje é a juventude que lhe é tirada. Amanhã é o bem-estar material e assim sucessivamente: mudam as amizades, mudam os costumes, mudam as cidades. A necessidade separa os seres que se amam; mudam todos os seres que se amam. E, quando não é pela necessidade, é pela morte ou o desamor. Um rico senhor perdeu a sua amada e consultou um clarividente para conhecer o futuro. Desejava saber se o objeto de seu amor voltaria a ele. Responderam-lhe que não. Irritado, disse: “Tenho dinheiro, posso dispor de qualquer soma para obter o que desejo.” Mas, ainda assim não conseguiu o que desejava.
Há mudanças que estão além das possibidades humanas, laços que se quebram e jamais serão reatados. Para os homens do mundo, essas mudanças e abandonos são muito amargos. Mas, para o estudante espiritual, esses sacrifícios são fonte de dulcíssimo consolo. Sofre ainda a carne na separação e nas mudanças, porém é um sofrimento que se transforma em êxtase, já que o que se teve é do próprio ser, passem os anos, mudem as coisas, morram os seres.



Ensinança 5: O Passado

De muitas coisas é possível desfazer-se, mas quem pode desfazer-se de seu passado? E, ainda mais, quem pode desfazer-se da recordação congênita de suas passadas experiências através das vidas e das mortes?
O passado pesa sobre os seres como uma capa de chumbo. É dor contínua, a cruz eterna, tão difícil de arrojar. Quantas vezes se ouve dizer: “Quisera ser bom, mas não posso; meus instintos sempre me levam ao que fui.” Quantas vezes o passado é obstáculo, ainda para os mais desejosos de entrar na Senda do Espírito. E  mesmo para os muitos adiantados no caminho da perfeição, o passado surge muitas vezes diante deles como um terrível inimigo que, sob a forma de impulsos, recordações, chamados e relações com a antiga vida, impede-os de progredir como desejariam. Mas, ainda aqui, o Sacrifício é libertador. Abandonar-se nos braços da Vontade Eterna, tomar tudo das mãos dos Senhores do Karma, pôr-se incondicionalmente a serviço dos Quatro Cavalheiros que custodiam a gruta de Ras, é vencer esta dor, fruto dos acúmulos passados. Não temer as conseqüências de ontem é preparar um amanhã feliz, é apagar a recordação, tão daninha para o adiantamento.
É muito sábia aquela lei pela qual o homem esquece seu passado ao renascer. E tem seu valor fundamental aquela confissão católica que diz que, se bem que a absolvição não tire a pena das culpas, apaga o pecado - ou, em outras palavras, apaga a recordação do passado. É ainda Krishnamurti quem diz: “Recordar é viver o passado e atar-se a ele”.


Ensinança 6: A Incerteza do Amanhã

O não poder ter sempre a mesma orientação na vida, em uma palavra, a incerteza do porvir, é sofrimento contínuo para a alma. Hoje, parece que o mundo está nas mãos de um feliz conquistador. Amanhã, esse rei de sonho cai no desalento. A leitura de um livro abre hoje um horizonte novo à mente do leitor, todos os pontos obscuros sobre a doutrina buscada estão elucidados. E amanhã, uma palavra nova, um conceito novo, volta a inundar de trevas a mente. Diz o homem, hoje: “Encontrei a verdade”. E tem de comprovar amanhã que a verdade está longe dele.
Vêem-se além disso, tantos casos estranhos na vida diária. Homens de bem que cometem ações indevidas que eles mesmos acreditavam haver apagado para sempre de sua conduta moral. A cada dia vêem-se homens - que haviam eleito o caminho da virtude e do adiantamento espiritual - olhar para trás e serem transformados em estátuas de sal.
Ante tantos fatos assim, a alma se pergunta ansiosa: “Que será de mim amanhã? Chegarei ao final da Obra?” Só o Sacrifício pode elucidar o amanhã, porque aquele que pôs seu trabalho na mãos dos Mestres não pode cair nunca, porquanto está escrito no Templo: “Aquele que trabalha para si tem já sua recompensa e nada pode reclamar amanhã. Mas aquele que trabalha para a Grande Obra tem sua recompensa nas mãos dos Mestres.”
Quanto mais forte for o desprendimento do ser de seu amor próprio, quanto mais se sacrifique renunciando ao fruto da satisfação pessoal, menos incerto se mostrará a ele o porvir.



Ensinança 7: A Carne

Os Sacrifícios descritos até aqui são interiores e da alma. Passam muitas vezes inadvertidos porque ocorrem escondidos aos olhos dos homens, no íntimo do ser. Porém, há sacrifícios que, se bem não sejam tão sutis por serem materiais, não são menos fortes.
Estes Sacrifícios são inimigos feitos carne, aos quais se deve combater. A carne é uma dor sempre viva e são necessários duros sacrifícios para vencê-la. Além disso, disse o Mestre: “Os inimigos do homem são os de sua casa”.
A alma quer levantar vôo, aspira à perfeição, porém todos os afetos materiais se colocam diante dela, reclamando seus direitos. E, como a voz do sangue é forte como a própria morte, unicamente um ser disposto a um grande Sacrifício pode passar pela terrível prova. Por isso, parecem estranhas certas atitudes dos grandes seres.
Mary Baker Eddy viveu sempre longe de seu filho, sem lembrar-se dele. E quando o viu, já homem feito, olhou-o e, como não observasse nele o sinal da fé, de um possível adepto a suas crenças, disse-lhe: “Não te conheço, vai-te”. Francisco de Assis não teve vergonha em desnudar-se e atirar aos pés de seu pai suas roupas, exclamando com os olhos voltados para o céu: “Agora estou livre; unicamente poderei dizer: Pai nosso que estás nos céus”. Quem não recorda o frio olhar lançado por Buda aos corpos adormecidos de sua esposa e filho, antes de deixá-los para sempre? Joana de Chantal sente, na hora de abandonar seu lar, que seu coração de mãe se despedaça. Não obstante, quando seu filho atravessou o corpo para impedir-lhe a passagem, não hesitou em passar sobre ele e seguir seu caminho de perfeição.
Portanto, todos aqueles que querem encontrar a aliança do Espírito, têm que lutar contra a aliança da carne. E é desses grandes sacrifícios que a alma sai temperada e pode dizer: “Venci a carne e me revesti com um traje espiritual”.


Ensinança 8: “O Que Dirão”


Por mais que se faça, por mais que se procure harmonizar a vida do mundo com a vida do Espírito, o homem espiritual não pode fugir da murmuração e da censura.
Como se pode deixar de ver a lanterna posta sobre o cume do monte? Como pode ocultar-se o homem espiritual ao tomar esse caminho? Ele sobressai dentre o montão de homens e aquele que é objeto de muitos olhares tem que suportar as adulações e tolerar as censuras. Além do mais, como cada alma tem sua tendência particular, ainda entre os companheiros espirituais se encontra, às vezes, involuntários inimigos que fazem padecer imensamente. Um adágio antigo afirma que ‘os bons fazem sofrer os bons’.
É dura prova para uma alma nobre e sensível ver-se sempre contrariada ou incompreendida. Não é o padecer, nem o sofrimento, nem o trabalho o que abate as almas escolhidas, e sim, a incompreensão dos homens.
Que homem foi reconhecido em seu tempo? A humanidade enaltece os grandes e bons homens depois de mortos. Mas em vida, martiriza-os.
Este Sacrifício, de sobrepor-se à incompreensão dos próprios companheiros espirituais, de saber que os atos mais nobres e retos são, às vezes, injustamente apreciados, é uma força de construção tal, que lança os alicerces de um triunfo espiritual.


Ensinança 9: As Circunstâncias Materiais

Por mais que se eleve a alma acima das coisas humanas, não pode desprender-se totalmente delas e, muitas vezes, a luta pela vida, pelo sustento diário, parece entorpecer o adiantamento. Mas, não é assim.
A felicidade foi o ponto inicial da Criação Cósmica e a dor será o ponto final do grande drama do Universo. Mas, pela conjunção destas duas forças, mantém-se a vida.
A luta diária, o chamado das necessidades do corpo, é o ponto doloroso que, unido à felicidade interior do conhecimento espiritual, mantém o equilíbrio indispensável para a conquista da perfeição.
Muitos dizem: “A cidade me faz mal. Se vivesse longe do ruído, poderia ser melhor”. Outros se lamentam de seu emprego. Parece-lhes um obstáculo e uma ocupação completamente contrária às suas aspirações internas. Mas, nada é desprezível nas ocupações diárias que foram dadas ao homem.
Fugindo das obrigações materiais, o homem encontrará sempre seu inimigo. Mas, sacrificando-se e procurando fazer cada vez melhor o que não lhe agrada, transmutará essas coisas feias em atos belos, agradáveis e proveitosos.


Ensinança 10: A Compaixão

Quanto mais se adianta e mais se amplifica a consciência individual, tanto menos grosseiras são as sensibilidades, tornando-se mais sutis e mais amplas.
Pessoalmente compreende-se o porquê dos padecimentos e sofrimentos da humanidade, mas a dor coletiva chega intensamente até a Roda do Coração, enchendo-a da rosada cor da compaixão.
Todas as dores da humanidade se descarregam sobre a alma do discípulo que angustiado pergunta: “Por que sofrem tanto os homens? Por que são tão cegos os seres e se machucam continuamente entre si?” Esta terna compaixão é a que faz sofrer continuamente.
Sabe o estudante que nada se pode fazer para aliviar o mal do mundo exteriormente. Sabe que, por boas que sejam todas as instituições de beneficência, todos os asilos, todos os hospitais,  um alívio muito relativo podem trazer aos sofrimentos humanos.
Sabe também que o sentimentalismo da compaixão que muitos homens experimentam quando vêem uma dor, esquecendo-a em seguida, não só é vão, mas prejudicial, porque é um gasto inútil de energias. Mas também sabe que unicamente participando no íntimo dessa dor, pode repará-la em algo.
Diz um livro budista que, quando o coração do Buda se abre e olha o mundo, acalmam-se as dores, aliviam-se as penas, deixa-se de chorar e, por um instante, brilha a felicidade no mundo. Assim, todas as vezes que uma alma, em seu foro interno, sente em conjunto todo o mal da humanidade, lança o alicerce para uma Raça futura feliz.
Verdadeiros redentores da humanidade, os homens que sentem a essência da dor e que se sacrificam por essa dor interna - não só por eles, mas por todos em geral - conseguem, com esse sacrifício, uma das partes mais profundas da vida espiritual.


Ensinança 11: A Sabedoria

Se o nono mistério, em seu grau mais sublime, transforma um homem em um Mestre de Compaixão, o décimo mistério faz dele um Mestre de Sabedoria.
A dor, para que tenha um valor eficiente, coletivamente só pode ser “sentida” e individualmente só pode ser “compreendida”.
Se a humanidade tem que ser auxiliada por aquele doce tormento de uma espera inefável, de um desejo contínuo de que todos advenham, de que todos sejam libertados das cadeias da dor, unicamente o caso de cada ser humano, o porquê de seu sofrimento, pode ser compreendido pelo estudante.
Aquele que sabe, aquele que sentiu em si todas as dores dos seres, aquele a quem nenhuma dor pode afetar, é o único que pode descer entre os homens e compreender suas dores. Conhece a raiz dos males, sabe porque são provocados e a que fim tendem. Nada estranha, nada o alarma. A ninguém qualifica de bom nem de mau. Serenamente analisa, esmiúça cada caso, até deixá-lo a descoberto e achar a causa do mal e da dor.
O padecimento, nas mãos daquele que sabe, transforma-se em poder - o poder vivo de transportar de um terreno impróprio a um propício, o poder de eliminar a dor pelo conhecimento da causa do mal. Podem esses seres descer até o mais profundo das misérias humanas, pois tão grande é o seu saber que nada lhes causa dano. Mas, extraem sempre novos motivos e experiências para eliminar os males de cada indivíduo. O conselho desses seres é vívida luz. O auxílio que prestam é de tão vital importância que não se apresenta na alma, senão que se insinua nela.
Só eles sabem corrigir aquele que não sabe, consolar aquele que erra, ensinar o bom caminho ao extraviado, alegrar quem está triste, perdoar as injúrias e sofrer com paciência toda sorte de adversidades.
Um deles, um desses Mestres de Sabedoria, passou um dia por um caminho e alguém que o viu disse: “Vi um homem desconhecido que me encheu a alma de felicidade”.


Ensinança 12: Os Defeitos Físicos

Todas as expressões de dor enumeradas até agora e enaltecidas pelo Sacrifício, de aspecto tão sutil, seja em sua manifestação interna, seja na externa, em nada diminuem a consideração dos sofrimentos e dos sacrifícios mais grosseiros e materiais.
Quem poderia negar o Sacrifício daquele ser a quem a Lei de Conseqüências condena desde o nascimento a um defeito físico? Quantos, desesperados pela terrível idéia de que nunca serão fisicamente semelhantes aos demais homens, chegaram ao ódio mais acirrado, à mais acentuada malícia contra todos? No entanto, não sabem eles que as sábias Leis Divinas nada tiram por um lado, sem compensar por outro.
Recordem os discípulos quanto bem podem fazer a esses pobres infelizes. Ensinem-lhes a suportar com nobre Sacrifício sua dor. Ensinem-lhes também que, se lhes falta ou é deficiente um órgão de seu corpo, seguramente terão outro que, bem cultivado, poderá dar-lhes grande satisfação e êxito. E que isso conseguirão, transmutando seus inúteis ímpetos maus em outros bons.
Feliz surdez a de Bethoven, que lhe fez perceber melodias de outro mundo, tão espirituais que bem poderia ser chamado de o Músico da Sabedoria. Feliz paralisia a de Roosevelt, que desenvolveu tão potentemente suas forças mentais. Feliz prostração paralítica a de Tereza Neumann, que desenvolveu tão grandemente seus poderes psíquicos.
Uma freirinha, cega de nascimento, resignada e tranqüila, havia se dedicado exclusivamente à contemplação de Deus. E Deus a recompensou, abrindo sua visão astral e mostrando-lhe visões sublimes. Num entardecer, estava sentada à porta e Santa Brígida, a seu lado, contemplava o pôr-do-sol. Tão maravilhoso era o espetáculo e foi tanta a compaixão que esta última sentiu pela pobre cega, que rogou profundamente lhe fosse dada a visão, o suficiente para que pudesse ver o astro rei em todo o esplendor de sua púrpura. A cega obteve a visão e admirou a paisagem, mas depois pediu assim: “Agradeço a Deus e a ti, Madre, esta graça. Mas o que vejo não é comparável ao que estava acostumada a ver. Se é vontade de Deus, prefiro estar como antes e desfrutar da visão que tinha”. E em seguida, voltaram a fazer-se as trevas exteriores para ela, para que pudesse gozar da luz interior.


Ensinança 13: As Enfermidades

A dor é, então, companheira de todos os homens, sob todo aspecto e forma. As forças mentais são continuamente obstaculizadas e oprimidas pelas deficiências físicas, pelas enfermidades. Um médico disse que a humanidade está doente - e não dizia mal, já que não há homem que não padeça de um mal físico, maior ou menor. Desde a juventude se estabelece no organismo essa luta oculta e acirrada entre o princípio de destruição e o conjunto de resistências.
Quando mais parece necessária a força física para o triunfo, aparece um inimigo - até então ignorado - em forma de doença, para abater o homem. Aqui entram em jogo dois importantes fatores: o temor, que é eficiente auxiliar do princípio da destruição, e o espírito de Sacrifício, que é o auxiliar do conjunto de resistências.
Não há nada mais belo que a conformidade e o estoicismo nas enfermidades. Aquele que toma a doença – que parece incurável - como um meio de aperfeiçoamento, com verdadeiro espírito de Sacrifício, às vezes consegue vencê-la. O grande general San Martin, quando se viu completamente arrasado pelas hemorragias produzidas por suas úlceras estomacais, pensou que não valia a pena ocupar-se de seu corpo e dedicou-se totalmente às suas tarefas militares, dizendo: “Quero terminar minha obra antes de morrer. Não importa minha enfermidade nem os conselhos dos médicos”, e assim curou-se.
Há casos em que a força do pensamento e o espírito de Sacrifício, se bem que não possam vencer a doença - por ser muito grave - localizam-na de tal modo que formam a seu redor uma defesa, não lhe permitindo sair de sua cidadela. A dor física, às vezes, não só mantém o homem desperto, mas atua como um estimulante para que ele siga adiante.
Perguntou um discípulo a seu amigo doente - que sofria de fortes dores lombares - se padecia muito. O amigo respondeu: “Não muito, esta dor me serve de ponto de concentração”.


Ensinança 14: A Separatividade


A inefável felicidade é a realização do estado potencial. A dor é a realização do estado ativo.
Em suma, a vida se manifesta, em todo seu esplendor, através do sofrimento. Não só abate os seres humanos com martírios morais, com padecimentos físicos, com penas ocultas, senão que persegue os homens de toda forma e maneira.
O país em que se nasce, a raça a que se pertence, a cor característica da pele, todas essas são armas nas mãos do destino para que o homem coma seu pão amassado com lágrimas. E, quando esses espasmos dolorosos do mundo se tornam intoleráveis, reage a dor com a dor, o martírio com o martírio, o sangue com o sangue: produzem-se revoluções, guerras, dissensões políticas, lutas raciais, derramando a mãos cheias o sofrimento sobre a terra.
Quantos Sacrifícios heróicos tem registrado a dor da separatividade humana! Mas o Sacrifício verdadeiro, que redime e eleva, não é o do homem que vai à morte embandeirado e sim daquele que sacrifica sua forma exterior para parecer-se com todos os homens, para fazer de todas as comunidades humanas uma só sociedade. Em vão se clamará pela paz universal. Inutilmente se quererá implantar a fraternidade entre todos os seres, se cada um não quiser sacrificar-se em seu foro íntimo.
Diz-se que todos os homens são iguais, mas cada ser mantém dentro de si sua separatividade. O rico se crê superior ao pobre; o de raça branca se crê superior ao homem de cor. A diversidade está dentro do ser, está em seu conceito pessoal. Unicamente sacrificando este princípio próprio, pode-se chegar a fazer uma obra de paz no mundo.


Ensinança 15: As Taras Morais

O maior peso, a carga mais pesada que a humanidade suporta são as taras morais dos indivíduos. Espanta ver numa criança, o feroz instinto criminoso que amanhã o levará ao delito e à destruição de seus semelhantes. Há uma infinidade de homens que nasce com um desses estigmas que unicamente a morte pode extirpar. Vampiros, degenerados, criminosos, seres capazes, por seu instinto, de inauditos males.
Ainda em cérebros esclarecidos existem, às vezes, esses pequenos centros do mal que os incitam continuamente a determinadas ações repudiáveis. Rousseau, que teve o valor de confessar seu mal interno, é um testemunho disto.
Porém, uma pergunta surge na mente: que Sacrifício cabe aqui, seja para eles, seja para os demais, se aqueles pobres seres não podem corrigir-se nem os outros podem ajudá-los?
Sim, cabe o Sacrifício. Cabe neles, com o esforço continuado que, ainda fracassando, sempre abre a porta para um próximo ou longínquo porvir de redenção. E cabe, nos outros seres, sob forma de tolerância para com eles. Porém, quem mais tem que vencer essa instintiva repugnância que esses seres inspiram e procurar tolerar seus males são os estudantes esotéricos, pois eles sabem o porquê de todas as coisas e as leis inexoráveis que as regem.
Jamais cairá no vazio uma boa palavra ou um bom conselho, porque tudo frutifica a seu tempo, visto que esses seres, escravos hoje, poderão ser luminares numa próxima vida.


Ensinança 16: A Morte

Chegamos ao último mistério, à mais solene dor, ao Sacrifício que ninguém pode eludir, pois quem pode vencer a velhice e a morte?
É sempre causa de pesar para o pobre ser humano ver como os anos lhe escapam das mãos. Ver como o tempo foge rapidamente e, por mais que se apresse, por mais que se esforce, muito poucas das ilusões forjadas na juventude podem ser cumpridas. Ou então, quando começa a gozar do fruto de sua obra, já fraqueja a memória, debilitam-se os sentidos e os achaques da velhice lhe impedem o deleite mental da vitória. Quando nem ainda começou a vida, já tem que dar-se conta de que a velhice bate à porta.
Às vezes, os anos de decadência física são anos de longo martírio para os homens que perdem suas forças, para as mulheres que perdem sua beleza. Nem todos têm o valor de Frinéia, a bela grega, que preferiu atirar-se na fogueira antes de ver decair sua beleza física. Os demais esperam e esperam, envelhecem e morrem lentamente. E a morte, quando vem, ainda que na maior ancianidade, nunca é bem recebida.
A morte ronda por toda parte. Não obstante, o indivíduo vive como se nunca devesse morrer, como se ele fosse o único digno de escapar à última lei. Para muitos, só a idéia da morte já lhes causa temor. Não querem que se fale dela em sua presença e fogem de toda conversa fúnebre.
Mas, que belo é o Sacrifício de morrer voluntariamente, morrer de antemão, para vencer a parte dolorosa da morte, que é o temor.
Para aquele que aprendeu a olhar desde cedo a última inimiga face a face, pouco a pouco ela perde para ele seus véus misteriosos e, pelo Sacrifício de pensar nela, consegue possuí-la de antemão.
Diz-se que os frades trapenses todos os dias levantam uma pá de terra, preparando paulatinamente sua tumba. Bom é tirar todos os dias da mente uma pá dessa terra moral - que os ressaibos do temor e da obscuridade ignorante depositaram sobre ela - para deixar livre o conceito da morte tal como é: um sono tranqüilo conseguido pelo Sacrifício contínuo do conhecimento.

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Ensinança 1: Os Mistérios do Sacrifício

Ensinança 2: O Tédio
Ensinança 3: A Luta pela Vida
Ensinança 4: As Mudanças Contínuas
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Ensinança 6: A Incerteza do Amanhã
Ensinança 7: A Carne
Ensinança 8: “O Que Dirão”
Ensinança 9: As Circunstâncias Materiais
Ensinança 10: A Compaixão
Ensinança 11: A Sabedoria
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